O desmatamento indiscriminado nas terras dos cerrados está gerando conflitos entre grandes fazendas de soja e pequenos produtores dos municípios de Baixa Grande do Ribeiro e Ribeiro Gonçalves, a cerca de 600 km ao sul de Teresina, uma das regiões mais prósperas dos cerrados piauienses. O crime ambiental está soterrando plantações de capim e causando o envenenamento de riachos e olhos d’água.
Os moradores temem que animais que bebem as águas dos riachos estejam sendo envenenados e que eles próprios, moradores, também sejam afetados. A denúncia de assoreamento das pastagens e do envenenamento de animais através da água dos riachos, e do risco do problema também afetar moradores das duas cidades foi levada na semana passada à Secretaria Estadual do Meio Ambiente (Semar).
O problema ocorreu por causa do desmatamento de áreas além do permitido nas terras da Serra Branca. Os produtores de grãos desmataram áreas muito próximas às margens das descidas para as localidades situadas abaixo da serra, os chamados “baixões”, terras ricas em nascentes de riachos e próprias para criação de gado. A lei determina que sejam preservados pelos menos 200 metros de mata virgem entre a serra e as descidas para os baixões, para que a vegetação nativa contenha a água e areia que escoam com as chuvas.
Como essa área de contenção foi desmatada, a água das chuvas desce serra abaixo, carregando areia, pedras e o que mais encontrar pela frente. Foi exatamente isso que ocorreu nos dias 12 e 13 de março, quando choveu 150 mililitros na Serra Branca (a média da região, quando chove bem, é de 30 mililitros). O envenenamento pode estar ocorrendo porque a água que desce serra abaixo também leva consigo resíduos de produtos químicos utilizados nas plantações e o óleo dos caminhões e máquinas de plantação e colheita.
O problema atinge comunidades e pequenas fazendas nos municípios de Baixa Grande do Ribeiro e Ribeiro Gonçalves, onde estão localizadas algumas das maiores fazendas de produção de grãos dos cerrados. Cerca de 150 famílias residem nos baixões, situados a aproximadamente 2 mil metros abaixo da serra. A equipe do DIÁRIO DO POVO esteve no local anteontem e acompanhou uma reunião de pequenos produtores e criadores com donos de fazendas de grãos.
ÁGUA CONTAMINA NASCENTES
Segundo moradores da região, três riachos que cortam as localidades estão com suas águas envenenadas pelos defensivos agrícolas utilizados nas plantações de soja, milho e outros grãos no alto da serra. Eles temem que várias nascentes de riachos e olhos d´água desapareçam sob a areia que as águas trazem da serra. Nos últimos 30 dias, o gado criado nas pequenas fazendas, que bebe a água dos riachos, emagreceu repentinamente e apresentou sintomas de fraqueza e outros problemas.
Os criadores não têm dúvidas de que os animais foram atingidos pelo óleo diesel e pelos diversos tipos de veneno utilizados nas plantações de soja e milho. “Esta época do ano os animais estão sempre sadios, gordos. Não é para estarem magros e doentes assim”, lamenta o agricultor Valdimiro Quixabeira da Rocha, da localidade Nossa Senhora da Aparecida. O agricultor Oscar Quixabeira da Rocha disse que toda uma área de pastagem da pequena fazenda dele foi tomada pela areia que desceu da serra. Segundo ele, aproximadamente 20 hectares de pasto estão perdidos ou comprometidos.
Em uma das áreas afetadas, o areial cobriu parte da plantação de capim braquiara e transformou um amplo capinzal num local parecido a um campo de pouco de avião pequeno. “Tudo meu está aqui, tem hora que dá vontade de desistir”, diz ele, desolado. Ao lado da plantação de capim quase completamente destruída, erguem-se imponentes paredões de arenito de mais de 300 metros. Lá no alto está a Serra Branca, onde a soja e o milho reinam absolutos. (MG)
PRODUTORES RECONHECEM PROBLEMA
Na última terça-feira, representantes das fazendas da Serra Branca desceram aos baixões para reunião com os moradores afetados pelos problemas decorrentes do desmatamento. Na quarta à noite, foi a vez de agricultores subir a serra para conversar com os produtores. A reportagem do 180graus presenciou a conversa deles com o gerente do Condomínio Galliota, Marcos Jordão,que detém uma faixa de terras com soja e milho nas proximidades da descida para os baixões.
Marcos Jordão disse que a produção do condomínio também foi afetada pelas águas que desceram serra abaixo. “Perdemos 400 hectares de milho. A água que desceu aqui parecia um rio, arrastando tudo”, afirmou. Segundo ele, o problema reside 18 km acima da propriedade dele, devido à falta de curvas de nível no chão para “segurar” a água das chuvas. No local, foram desmatados cerca de 6 mil hectares no ano passado, mas não foram feitos os “bigodes”, como eles chamam a curva de nível.
Marcos se comprometeu a colocar máquinas para fazer uma estrada na ladeira para os baixões e ajudar na reconstituição do pasto destruído. Ontem, Oscar Rocha e outros agricultores dos baixões foram conversar com a direção da fazenda Brasil Agro, a outra empresa acusada de responsável pelo desmatamento irregular. A direção da fazenda se comprometeu a instalar as curvas de nível para conter a água das chuvas e também a indenizar as famílias atingidas reconstituindo as pastagens. (MG).
REPÓRTER: Mussoline Guedes - Especial para o 180graus
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